O Superior Tribunal de Justiça (STJ) proferiu uma decisão de extrema relevância no cenário do Direito Empresarial e do Direito de Família: a impenhorabilidade do bem de família se mantém mesmo após a morte do devedor, garantindo a proteção da moradia aos herdeiros. Esse entendimento, firmado recentemente, reforça a importância da dignidade da pessoa humana e da função social da propriedade, oferecendo maior segurança jurídica a milhares de famílias brasileiras.
Neste artigo, vamos analisar em detalhes o caso concreto, a fundamentação jurídica utilizada, os entendimentos anteriores do STJ e as consequências práticas dessa decisão para herdeiros e credores.
O Caso Concreto: Dívida Tributária e Herança de Imóvel
O processo analisado pelo STJ envolvia uma execução fiscal movida pelo Fisco contra devedores que, em vida, haviam acumulado dívidas tributárias. Esses devedores faleceram durante o curso do processo, deixando como patrimônio um único imóvel residencial, caracterizado como bem de família.
Diante da morte, a execução foi direcionada para o inventário, e a grande controvérsia surgiu:
- O imóvel poderia ser penhorado para quitar as dívidas deixadas pelos falecidos?
- Ou os herdeiros, residindo no bem, poderiam invocar a impenhorabilidade do bem de família prevista em lei?
Em primeira instância, o juiz entendeu que a impenhorabilidade era direito pessoal do falecido, não se estendendo aos herdeiros. Esse raciocínio foi mantido pelo Tribunal de Justiça em segunda instância, que reforçou que a herança deve responder pelas dívidas no limite do patrimônio transmitido.
No entanto, a discussão chegou ao STJ, que reverteu a decisão, assegurando a proteção da impenhorabilidade mesmo após a morte do devedor.
Fundamento Jurídico: Lei 8.009/1990 e o Código Civil
O ponto central da análise envolve duas normas jurídicas:
- Lei 8.009/1990 – Estabelece a impenhorabilidade do bem de família, ou seja, o imóvel utilizado como residência da entidade familiar não pode ser penhorado para pagamento de dívidas.
- Código Civil (art. 1.792 e seguintes) – Determina que os herdeiros respondem pelas dívidas do falecido até o limite da herança recebida.
À primeira vista, parece haver um conflito: se o imóvel integra a herança, ele deveria responder pelas dívidas. Contudo, a Lei 8.009/1990 protege o bem de família como um direito fundamental à moradia.
O STJ solucionou esse aparente conflito de forma a prestigiar a dignidade da pessoa humana: o caráter de bem de família se transmite aos herdeiros, garantindo-lhes o direito de continuar residindo no imóvel.
A Decisão do STJ: RESP 2.168.820/RS
O caso foi analisado no Agravo Interno no Recurso Especial (RESP) nº 2.168.820/RS, de relatoria do ministro Benedito Gonçalves, julgado em 2025.
Na decisão, o STJ fixou que:
- A impenhorabilidade do bem de família subsiste mesmo após a morte do devedor;
- Caso os herdeiros residam no imóvel, a proteção legal deve ser assegurada;
- Ainda que o bem esteja submetido a inventário, não pode ser penhorado em execução fiscal ou em outros tipos de cobrança, desde que configurado como residência da família.
Esse entendimento consolida uma interpretação humanizada da Lei 8.009/1990, em consonância com os princípios constitucionais de proteção à moradia e à família.
Precedentes Reforçando o Entendimento
O STJ já havia se manifestado em decisões anteriores no mesmo sentido. Um exemplo é o RESP nº 1.271.277/MG, de relatoria do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, que também reconheceu a impenhorabilidade em situações semelhantes.
A diferença é que, neste novo julgamento de 2025, o Tribunal reafirma e amplia a tese, criando um paradigma mais sólido e abrangente para os casos futuros.
Impactos da Decisão: Herdeiros e Credores
Para os Herdeiros
- Garante a dignidade da moradia: os filhos ou demais herdeiros podem continuar residindo no imóvel, mesmo diante de dívidas deixadas pelo falecido.
- Evita situações de vulnerabilidade social, impedindo que famílias sejam despejadas para satisfazer obrigações financeiras.
- Traz segurança jurídica, pois reconhece que a proteção do bem de família não é limitada à pessoa do devedor, mas se estende à sua família.
Para os Credores
- Restringe as possibilidades de satisfação do crédito, já que o bem de família continua impenhorável.
- Impõe a necessidade de buscar outros bens deixados pelo devedor ou adotar medidas alternativas de cobrança.
- Exige maior cautela nas estratégias de execução, principalmente em execuções fiscais.
A Relação entre Dignidade da Pessoa Humana e Direito Sucessório
A decisão do STJ reafirma que o direito sucessório deve ser interpretado à luz dos princípios constitucionais. O Código Civil, ao prever a responsabilidade dos herdeiros pelas dívidas do falecido, não pode se sobrepor ao direito fundamental à moradia.
Portanto, a herança responde sim pelas dívidas, mas não quando isso comprometer a função social do bem de família. Essa ponderação entre normas é típica da atuação do STJ, que busca harmonizar o sistema jurídico com valores constitucionais.
O Que Essa Decisão Representa para o Futuro
A partir desse precedente, espera-se que os tribunais inferiores adotem uma postura mais uniforme, garantindo:
- Maior proteção aos herdeiros em processos de execução;
- Menor margem para decisões conflitantes em primeira e segunda instâncias;
- Reforço da função social da propriedade e da moradia como direitos prioritários.
Além disso, essa decisão não se restringe apenas às execuções fiscais, mas pode ser aplicada também em dívidas de natureza civil, trabalhista e bancária, desde que o imóvel mantenha sua natureza de bem de família.
Conclusão
O STJ, ao reconhecer a impenhorabilidade do bem de família mesmo após a morte do devedor, reforça a importância da dignidade da pessoa humana e da moradia como direitos fundamentais.
Essa decisão oferece um alívio e uma proteção significativa aos herdeiros, que podem manter sua residência mesmo diante de dívidas herdadas. Para os credores, por outro lado, representa a necessidade de reavaliar suas estratégias de cobrança e buscar alternativas para satisfação do crédito.
Trata-se, sem dúvida, de um marco jurídico que fortalece a função social da propriedade e a proteção da família no ordenamento brasileiro.
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